domingo, 17 de novembro de 2013

A FAMA DE RICO



"O coronel Manoel Rabelo, influente fazendeiro no Brasil Central, fora acometido de
paralisia nas pernas.
Vivia no leito, rodeado pelos filhos atentos. Muito carinho. Assistência contínua.
No decurso da doença veio a conhecer a Doutrina Espírita, que lhe abriu novos
horizontes à vida mental.
Pouco a pouco desprendia-se da idéia de posse.
Para que morrer com fama de rico?
Queria agora a paz, a bênção da paz.
Viúvo, dono de expressiva fortuna e prevendo a desencarnação próxima, chamou os
quatro filhos adultos e repartiu entre eles os seus bens.
Terras, sítios, casas e animais, avaliados em seis milhões de cruzeiros, foram divididos
escrupulosamente.
Com isso, porém, veio a reviravolta.
Donos de riqueza própria, os filhos se fizeram distantes e indiferentes.
Muito embora as rogativas paternas, as visitas eram raras e as atenções inexistentes.
Rabelo, muito triste e quase completamente abandonado, perguntava a si mesmo se não
havia cometido precipitação ou imprudência.
Os filhos não eram espíritas e mostravam irresponsabilidade completa.
Nessa conjuntura, apareceu-lhe antigo e inesperado devedor. O Coronel Antônio Matias,
seu amigo da mocidade, veio desobrigar-se de empréstimo vultuoso, que havia tomado
sob palavra, e pagou-lhe dois milhões de cruzeiros em cédulas de contado.
Na presença de dois filhos, Rabelo colocou o dinheiro em cofre forte, ao pé da cama.
Sobreveio o imprevisto.
Os quatro filhos voltaram às antigas manifestações de ternura. Revezavam-se junto dele.
Papas de aveia. Caldos de galinha. Frutas e vitaminas.
Mantinham os cobertores quentes e fiscalizavam a passagem do vento pelas janelas.
Raramente Rabelo ficava algumas horas sozinho.
E, assim, viveu ainda dois anos, desencarnando em grande serenidade.
Exposto o cadáver à visitação pública, fecharam-se os filhos no quarto do morto e,
abrindo aflitamente o cofre, somente encontraram lá um bilhete escrito e assinado pela
vigorosa letra paterna, entre as páginas de surrado exemplar de
“O Evangelho segundo o Espiritismo”.
O papel assim dizia:
“Meus filhos,
Deus abençoe vocês todos.
O dinheiro que me restava distribuí entre vários amigos para obras espíritas de caridade.
Lego, porém, a vocês, o capítulo décimo quarto de “O Evangelho segundo o Espiritismo”.
E os quatro, extremamente desapontados, leram a legenda que se seguia:
“Honrai a vosso pai e a vossa mãe. — Piedade filial.” (Hilário Silva, Almas em desfile, p. 7-8)

O que pensar de filhos ingratos e sem amor?

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