“Gostaria
de deixar uma mensagem para os irmãos terrícolas. Meu exemplo foi o da dor, mas
encontrei-me com a Verdade Maior. Sou, hoje, um espírito em vias de regeneração
e busco minha libertação com tenacidade, porque agora reconheço o caminho que
conduz à paz.
Em
épocas remotas, enverguei trajes guerreiros. Lutava, combatia com ardor, mas
sem uma direção definida de vida. Apenas vivia ao sabor das conquistas e dos
prazeres do mundo.
Tinha
eu um grande domínio em terras e a expansão delas era praticamente meu único objetivo.
Mas, os tempos passaram e tornei-me um velho para os padrões vigentes. A morte então
veio me levar, e não tinha eu bons valores para pesar na balança da Justiça de
Deus.
Mais
à frente, voltei ao mundo físico em condições miseráveis, vindo a me tornar um reles
escravo. Trabalhava sob dura disciplina, não havendo momento certo para
descanso.
Normalmente,
apenas algumas horas de sono nos eram permitidas. Refiro-me às galeras romanas.
Era eu um pobre remador, que passava seus dias sob ferros.
Em
certa oportunidade, uma borrasca mais forte veio a ocorrer, e o navio onde prestava
serviço foi a pique. Salvei-me por milagre, pois minhas correntes, já gastas,
se partiram quando grossa acha de madeira tombou sobre elas, enquanto o navio
soçobrava.
Nadei
com dificuldade até encontrar uma espécie de tonel, onde me segurei. Muitos
homens, fortes e sadios, vi morrerem pelas águas. Outros, muito feridos, não
puderam suportar.
Somente
eu e um humilde empregado livre da embarcação sobrevivemos, pois conseguimos chegar
a uma ilha, perto da qual naufragáramos.
Durante
anos vivi com as argolas de ferro em meus membros. Delas não pude eu me livrar.
Parecia que ficavam lá para lembrarem-me da minha miserável condição. Não
poderia, sequer, ser resgatado por alguma embarcação, pois que seria recolhido
como escravo novamente. Assim, tive que escolher viver no isolamento. Era livre
agora, mas estava só, porque meu companheiro de infortúnio rapidamente partiu
em busca da civilização. Neste estado, vivi às custas de escassos recursos de
alimentação e moradia. Porém, pude meditar sobre a vida, tendo como companhia
os animais e o vento incessante que vinha do mar. Estes não falavam comigo e
até sentia que me rejeitavam de certa forma. Então, aprendi a perscrutar minha
alma e a entender meus sentimentos. Adquiri compaixão pelos seres viventes.
Como era só, aprendi a valorizar toda forma de vida. A natureza bravia
ensinou-me a ser humilde.
Após
muito tempo nesta situação, volvi meus olhos para o céu pela última vez,
deixando o corpo de carne.
Liberto,
atingi estância de rara beleza, mas seus portões estavam fechados. O porteiro, poderoso
romano em sua resplendente armadura, barrou-me a passagem, indagando: “– Alto lá!
O que queres aqui?” Respondi: “– Sou apenas um escravo e quero voltar a
trabalhar.” Em meu íntimo desejava voltar a ter contato com as pessoas, mesmo
que isto custasse a minha liberdade novamente. Então, o imponente homem analisou-me
por uns instantes, mandando-me esperar. Após algum tempo, belo homem de alvas
roupagens veio atender-me. Seus cabelos brancos indicavam que deveria ter larga
experiência de vida. Ele disse-me que poderia entrar e que as argolas que
demarcavam a minha condição de escravo seriam retiradas, já que naquele lugar
só eram aceitos homens livres para o trabalho. Estremeci de alegria, pois não esperava
tão grande sorte, aceitando prontamente a oferta.
Uma
vez sendo incorporado à bela cidade espiritual, recebi a humilde incumbência da
enfermagem. Tratava das feridas, das chagas daqueles que desencarnavam,
principalmente em campos de batalha, mas que tinham mérito de serem acolhidos
pelos espíritos de luz. Depois de longos anos de trabalho árduo, desenvolvi uma
compaixão e solidariedade mais profundos com relação àqueles que sofrem. Pude
perceber, que a solidão pela qual passei na ilha enquanto encarnado, mais a
possibilidade de auxiliar meus antigos algozes romanos em plena espiritualidade,
confraternizando-me com eles, era um sublime aprendizado de Amor ao próximo que
eu recebia. Ou seja, a aspereza daquela minha vida material foi o remédio amargo
que contribuiu decisivamente para a cura de meu espírito. Eu soube sorvê-lo sem
revolta, alcançando minha liberdade com relação ao desejo de conquistas, e
transformando a frieza do meu coração em receptividade para com o sofrimento
alheio.
Mais
à frente, reencarnei muitas vezes, podendo testar-me mais quanto às qualidades espirituais.
Falhei em algumas oportunidades, melhorei-me em outras, mas não posso esquecer-me
da já remota experiência que tive naquela ilha. Aquela encarnação está bastante
viva em minha alma, pois foi o momento do meu despertar como ser humano e como
filho de Deus”.
Simão 09/05/1995
(Espíritos diversos, Depoimentos
do além, p. 46-47)
As
sucessivas reencarnações são para nós espíritos endividados ou recalcitrantes a
única maneira de nos purificarmos
e nos
tornarmos merecedores de companhias espirituais cada vez mais elevadas.É também
de maneira geral, o único modo de conquistarmos condições melhores de novas
reencarnações.