sexta-feira, 3 de agosto de 2012

A ESCRAVA DO SENHOR


“Quando João, o discípulo amado, veio Ter com Maria, anunciando-lhe a detenção do Mestre,  o coração materno, consternado, recolheu-se ao santuário da prece e rogou ao Senhor  Supremo poupasse o filho querido. Não era Jesus o Embaixador Divino? Não recebera a  notificação dos anjos, quanto à sua condição celeste? Seu filho amado nascera para a  salvação dos oprimidos... Ilustraria o nome de Israel, seria o rei diferente, cheio de amoroso  poder. Curava leprosos, levantava paralíticos sem esperança. A ressurreição de Lázaro, já  sepultado, não bastaria para elevá-lo ao cume da glorificação?
E Maria confiou ao Deus de Misericórdia suas preocupações e súplicas, esperando-lhe a  providência; entretanto, João voltou em horas breves, para dizer-lhe que o Messias fora  encarcerado.
A Mãe Santíssima regressou à oração em silêncio. Em pranto, implorou o favor do Pai  Celestial. Confiaria n’Ele.  Desejava enfrentar a situação, desassombradamente, procurando as autoridades de  Jerusalém. Mas, humilde e pobre, que conseguiria dos poderosos da Terra? E, acaso, não contava com a proteção do Céu? Certamente, o Deus de Bondade Infinita, que seu filho  revelara ao mundo, salvá-lo-ia da prisão, restituí-lo-ia à liberdade.
Maria manteve-se vigilante. Afastando-se da casa modesta a que se recolhera, ganhou a rua  e intentou penetrar o cárcere; todavia, não conseguiu comover o coração dos guardas.
Noite alta, velava, súplice, entre a angústia e a confiança.
Mais tarde, João voltou, comunicando-lhe as novas dificuldades surgidas. O Mestre fora  acusado pelos sacerdotes. Estava sozinho. E Pilatos, o administrador romano, hesitando  entre os dispositivos da lei e as exigências do povo, enviara o Mestre à consideração de  Herodes.
Maria não pôde conter-se. Segui-lo-ia de perto.   Resoluta, abrigou-se num manto discreto e tornou à via Pública, multiplicando as rogativas  ao Céu, em sua maternal aflição. Naturalmente, Deus modificaria os acontecimentos,  tocando a alma de Antipas. Não duvidaria um instante. Que fizera seu filho para receber  afrontas? Não reverenciava a lei? Não espalhava sublimes consolações? Amparada pela  convertida de Magdala, alcançou as vizinhanças do palácio do tretarca. Oh! Infinita  amargura! Jesus fora vestido com uma túnica de ironia e ostentava, nas mãos, uma cana  suja à maneira de cetro e, como se isso não bastasse, fora também coroado de libertar-lhe a  fronte sangrenta e arrebatá-lo da situação dolorosa, mas o filho, sereno e resignado, endereçou-lhe o olhar mais significativo de toda a existência. Compreendeu que ele a induzia  à oração e, em silêncio, lhe pedia confiança no Pai. Conteve-se, mas o seguiu em pranto,  rogando a intervenção divina. Impossível que o Pai não se manifestasse. Não era seu filho o  escolhido para a salvação? Lembrou-lhe a infância, amparada pelos anjos... Guardava a  impressão de que a Estrela Brilhante, que lhe anunciara o nascimento, ainda resplandecia no alto!...
A multidão estacou, de súbito. Interrompera-se a marcha para que o governador romano se  pronunciasse em definitivo.
Maria confiava. Quem sabe chegara o instante da ordem de Deus? O Supremo Senhor  poderia inspirar diretamente o juiz da causa.
Após ansiedades longas, Pôncio Pilatos, num esforço extremo para salvar o acusado,  convidou a turba farisaica a escolher este Jesus, o Divino Benfeitor, e Barrabás, o bandido. O  povo ia falar e o povo devia muitas benções ao seu filho querido. Como equiparar o  Mensageiro do Pai ao malfeitor cruel que todos conheciam? A multidão, porém, manifestou-se, pedindo a liberdade para Barrabás e a crucificação para Jesus. Oh! - pensou a mãe  atormentada - onde está o Eterno que não me ouve as orações? Onde permanecem os anjos  que me falavam em luminosas promessas?
Em copioso pranto, viu seu filho vergado ao peso da cruz. Ele caminhava com dificuldade,  corpo trêmulo pelas vergastadas recebidas e, obedecendo ao instinto natural, Maria avançou  para oferecer-lhe auxílio. Contiveram-na, todavia, os soldados que rodeavam o Condenado  Divino.
Angustiada, recordou-se repentinamente de Abraão. O generoso patriarca, noutro tempo,  movido pela voz de Deus, conduzira o filho amado ao sacrifício. Seguira Isaac inocente,  dilacerado de dor atendendo a recomendação de Jeová, mas, eis que no instante derradeiro,  o Senhor determinou o contrário, e o pai de Israel regressara ao santuário doméstico em  soberano triunfo. Certamente, o Deus Compassivo escutava-lhe as súplicas e reservava-lhe  júbilo igual. Jesus desceria do Calvário, vitorioso, para o seu amor, continuando no  apostolado da redenção; no entanto, dolorosamente surpreendida, viu-o içado no madeiro,  entre ladrões.
Oh! A terrível angústia daquela hora!! ... Por que não a ouvira o Poderoso Pai?? Que fizera  para não lhe merecer a benção?
Desalentada, ferida, ouvia a voz do filho, recomendando-a aos cuidados de João, o  companheiro fiel. Registrou-lhe, humilhada, as palavras derradeiras. Mas, quando a sublime  cabeça pendeu inerte, Maria recordou a visita do anjo, antes do Natal Divino. Em retrospecto  maravilhoso, escutou-lhe a saudação celestial. Misteriosa força assenhoreava-se-lhe do espírito.
Sim... Jesus era seu filho, todavia, antes de tudo, era o Mensageiro de Deus. Ela possuía  desejos humanos, mas o Supremo Senhor guardava eternos e insondáveis desígnios. O  carinho materno poderia sofrer, contudo, a Vontade Celeste regozijava-se. Poderia haver lágrimas em seus olhos, mas brilhariam festas de vitória no Reino de Deus. Suplicara aparentemente em vão, porquanto, certo, o Todo-Poderoso atendera-lhe os rogos, não  segundo os seus anseios de mãe e sim de acordo com seu planos divinos.
Foi então que, Maria, compreendendo a perfeição, a misericórdia e justiça da Vontade do  Pai, ajoelhou-se aos pés da cruz e, contemplando o filho morto, repetiu as inesquecíveis  afirmações: - ‘Senhor, eis aqui a tua serva! Cumpra-se em mim, segundo a tua palavra!’”.
(Irmão X, Lazaro redivivo, p.7-9)
O amor, a fé e a esperança incomparáveis de Maria, que espera até o último instante para compreender os desígnios de Deus.
Teríamos nós coragem de vivermos as angústias dessa Mãe e ainda nos conformarmos com a vontade de Deus?

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