“O
coronel Manoel Rabelo, influente fazendeiro no Brasil Central, fora acometido
de paralisia nas pernas.
Vivia no
leito, rodeado pelos filhos atentos. Muito carinho. Assistência contínua.
No
decurso da doença veio a conhecer a Doutrina Espírita, que lhe abriu novos
horizontes à vida mental.
Pouco a
pouco se desprendia da ideia de posse.
Para que
morrer com fama de rico?
Queria
agora a paz, a bênção da paz.
Viúvo,
dono de expressiva fortuna e prevendo a desencarnação próxima, chamou os quatro
filhos adultos e repartiu entre eles os seus bens.
Terras,
sítios, casas e animais, avaliados em seis milhões de cruzeiros, foram
divididos escrupulosamente.
Com isso,
porém, veio a reviravolta.
Donos de
riqueza própria, os filhos se fizeram distantes e indiferentes.
Muito
embora as rogativas paternas, as visitas eram raras e as atenções inexistentes.
Rabelo,
muito triste e quase completamente abandonado, perguntava a si mesmo se não havia
cometido precipitação ou imprudência.
Os filhos
não eram espíritas e mostravam irresponsabilidade completa.
Nessa
conjuntura, apareceu-lhe antigo e inesperado devedor. O Coronel Antônio Matias,
seu amigo da mocidade, veio desobrigar-se de empréstimo vultuoso, que havia tomado
sob palavra, e pagou-lhe dois milhões de cruzeiros em cédulas de contado.
Na
presença de dois filhos, Rabelo colocou o dinheiro em cofre forte, ao pé da
cama.
Sobreveio
o imprevisto.
Os quatro
filhos voltaram às antigas manifestações de ternura. Revezavam-se junto dele.
Papas de
aveia. Caldos de galinha. Frutas e vitaminas.
Mantinham
os cobertores quentes e fiscalizavam a passagem do vento pelas janelas.
Raramente
Rabelo ficava algumas horas sozinho.
E, assim,
viveu ainda dois anos, desencarnando em grande serenidade.
Exposto o
cadáver à visitação pública, fecharam-se os filhos no quarto do morto e, abrindo
aflitamente o cofre, somente encontraram lá um bilhete escrito e assinado pela vigorosa
letra paterna, entre as páginas de surrado exemplar de O Evangelho segundo o Espiritismo.
O papel
assim dizia:
‘Meus
filhos,
Deus
abençoe vocês todos.
O
dinheiro que me restava distribuí entre vários amigos para obras espíritas de
caridade.
Lego,
porém, a vocês, o capítulo décimo quarto de O
Evangelho segundo o Espiritismo'.
E os
quatro, extremamente desapontados, leram a legenda que se seguia:
Honrai a vosso pai e a vossa mãe. — Piedade filial.”
(Hilário Silva, Almas
em desfile, p. 06)
Feliz o rico se despede da vida terrena com desprendimento
dos bens materiais.
A lição é muito
proveitosa aos materialistas, a quem considera
a propriedade como único bem a ser cultivado.
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