“Trago
em minha mente espiritual a triste história da trajetória da minha alma, ao
longo de várias encarnações, neste mundo.
Sempre
fui questionador, mesmo tendo vestes rotas cobrindo o meu corpo. Minha face
nunca se inclinava para baixo. Olhava os opositores altivamente,
independentemente de sua classe social. Tinha uma personalidade forte, não
permitindo humilhações com a minha pessoa. Palavras que fizessem diminuir a
minha importância não ficavam sem resposta. A dura guerra das palavras! Nunca
fugi dela! Por ela perdi a vida várias vezes.
Quando
vivi na França, também vim a desencarnar devido à troca de palavras ofensivas.
Neste país, outrora havia grande diferença entre a riqueza dos nobres e a
pobreza dos camponeses. Defendi os miseráveis e combati os donos do poder.
Praticamente ensandeci por tanto debater-me em contendas. Não aceitava a vida
com as suas aparentes injustiças sociais, pois desconhecia a lei universal de
ação e reação. O povo era sofredor e eu incorporei a sua dor, morrendo por
isto.
Percorri
estranhos caminhos além-túmulo. Perturbado, busquei os companheiros de luta,
mas não os encontrava. Alguns estranhos, com quem tentei confabular, não me
escutavam de forma alguma. Não sabia onde estava minha casa, nem meus
familiares. Tinha uma extrema necessidade de conversar sobre os velhos assuntos
da política, mas não tinha com quem fazê-lo.
Um
dia, quando a angústia cresceu em meu peito, uma força estranha parecia me
arrastar. Quando percebi, estava num lugar desconhecido, onde havia uma
aglomeração humana. Reconheci antigos amigos de ideais e de infortúnio, há
muito derrotados pelas garras do poder. Fiquei tão emocionado que não lembrei
que eles já haviam morrido. Na realidade, o choque causado pela minha morte
física turvou-me de tal forma o raciocínio, que eu não compreendia o meu novo
estado. Então, passei a prestar vívida atenção no que era dito por um deles,
mais afetado:
–
‘Companheiros! Vamos às armas! Não podemos mais tolerar os impostos! Não
aceitemos mais a tutela de homens vis, que usurpam a nossa liberdade de ação, o
livre-pensamento…’.
Fui
tomado por um êxtase. Ouvia exatamente o que queria. Isto é o que estava me
faltando há muito tempo. Pedi a palavra e discursei com toda a força do meu
espírito.
Instiguei
todos os presentes à guerra. Daríamos um basta à exploração do povo. Recebi
intensos aplausos, que me encheram de satisfação. Aqueles velhos correligionários
eram da mesma estirpe que eu. Contudo, a situação não se prolongou. Logo outro
veio substituir-me como centralizador das atenções. Este discursou e
combateu-me as ideias com veemência. Disse que não era com violência que se
modificavam os problemas dos homens, concitando-nos a seguir ao Cristo, pois
Ele sim é que revolucionou as relações de poder entre os seres humanos,
mostrando o caminho para o alívio das dores físicas e sofrimentos morais.
Fiquei
impressionado com a eloquência do contestante, que ao mesmo tempo transmitia
uma serenidade profunda, confundindo a todos. Porém, resoluto, retomei a palavra:
–
‘ Não! A miséria e a fome não se eliminam com sermões! A estrutura da sociedade
é milenar e a exploração do homem pelo homem remonta à época das cavernas. Só
pelas armas é que se pode modificar esta situação. Às armas!’
O
outro discursador, que escutara com paciência, permaneceu em silêncio. De olhos
cerrados, parecia concentrar-se em algo. Todos esperavam uma réplica e
mantinham uma atenção fixa naquele homem de porte altivo. Então, após a longa
expectativa, ele falou em tom pausado: – ‘Enquanto vocês buscarem a solução
para as suas dores, culpando o vosso semelhante, não encontrareis o caminho da
redenção. Enquanto enxergarem vossos irmãos como inimigos, estareis sempre em
conflito. Enquanto acharem que só a si pertence a razão, sereis estéreis. Só
aqueles que atravessarem a porta aberta pelo Cristo, é que alcançarão à Paz.’
Ao
término de sua réplica, o homem transformara-se. A sua figura agora estava radiante
de luz e, logo em seguida, tornou-se diáfana. Aos poucos o ser desaparecia
diante dos nossos olhos atônitos. Com isso, uns fugiram apavorados e outros
caíram de joelhos. Eu fiquei absolutamente paralisado por longos instantes. Uma
comoção percorria o meu íntimo. Algo estava se transformando, barreiras
quebravam-se, ilusões se desfaziam. Não queria modificar meus pontos de vista.
Eu resistia vigorosamente. Lutei contra aquela força avassaladora por tempo
indeterminado.
Caminhei
pensativo buscando outra região. Queria fugir de mim mesmo, para evitar o
inevitável. Não desejava mais a companhia daqueles velhos amigos, mas temia
seguir por caminhos novos, até que, em determinado dia, cheguei a um extenso
vale. Localizava-me na parte mais baixa do mesmo e podia divisar enormes
paredões escarpados à direita e à esquerda. Ali, só havia uma estrada a trilhar.
Subi lentamente, pois me sentia cansado e com falta de ar. Atravessei
espinheiros, feri meus pés em pedras pontiagudas, sentia tonteiras, fome e
sede. Não sabia bem porque estava determinado a ultrapassar àquele obstáculo
geográfico.
Quando
atingi um platô elevado, já praticamente sem forças, surpreendi-me com a presença
de alguns poucos amigos sinceros, de quem eu não me lembrava mais, pois pertenciam
a vidas pretéritas, cuja minha memória espiritual não alcançava. Eles acolheram-me
com carinho e levaram-me a uma bela cidade. Passei a residir na parte mais
humilde desta aglomeração de espíritos, percebendo, no dia a dia, que nunca eu
fora tão feliz como ali.
Após
a minha recuperação total, recebi a triste notícia de que teria de reencarnar.
Esta é a última oportunidade que tenho para dirigir minhas palavras aos homens,
antes de envergar novamente um corpo de carne e osso. Agora que eu estou
compreendendo melhor as Leis Maiores, senti uma grande necessidade de
comunicar-me com o mundo terreno, para que a minha história possa ser útil. Não
quero mais que minha voz traga a discórdia.
Meus
caros irmãos, somos eternos! Não fujam da realidade do espírito. Não são apenas
as pobres organizações materiais que existem. E elas são somente pálidos
reflexos do que está nos planos espirituais. Nós somos pequenos viajantes num
país de ilusões, que é a Terra. Não acreditem apenas no que os olhos materiais
podem enxergar. Busquemos no estudo do espírito o caminho da verdade. Assim,
nunca mais nos enganaremos com as falsas afirmativas e
pontos
de vista vaidosos e pessoais. Desejemos, enfim, a essência das coisas e dos
seres.” Um amigo 26/04/1995
(Espíritos
diversos, Depoimentos do além, p.
34-35)
A vida após a morte, é
cheia de surpresas para quem acredita que a alma tem uma destinação certa: o
céu ou o inferno.
Depara-se com uma “outra” vida para a qual não
se preparou, podendo permanecer neste estado por séculos até que se modifique,
ou seja, que reconheça seus erros e queira repara-los.
Compartilhado amiga Águeda este texto, que nos permite avaliar nosso papel aqui, onde é tão necessário fazermos o uso de nossa consciência.
ResponderExcluirParabéns pelas postagens edificantes, bjs e Luz!