domingo, 2 de dezembro de 2012

O Escravo da Ilha



“Gostaria de deixar uma mensagem para os irmãos terrícolas. Meu exemplo foi o da dor, mas encontrei-me com a Verdade Maior. Sou, hoje, um espírito em vias de regeneração e busco minha libertação com tenacidade, porque agora reconheço o caminho que conduz à paz.
Em épocas remotas, enverguei trajes guerreiros. Lutava, combatia com ardor, mas sem uma direção definida de vida. Apenas vivia ao sabor das conquistas e dos prazeres do mundo.
Tinha eu um grande domínio em terras e a expansão delas era praticamente meu único objetivo. Mas, os tempos passaram e tornei-me um velho para os padrões vigentes. A morte então veio me levar, e não tinha eu bons valores para pesar na balança da Justiça de Deus.
Mais à frente, voltei ao mundo físico em condições miseráveis, vindo a me tornar um reles escravo. Trabalhava sob dura disciplina, não havendo momento certo para descanso.
Normalmente, apenas algumas horas de sono nos eram permitidas. Refiro-me às galeras romanas. Era eu um pobre remador, que passava seus dias sob ferros.
Em certa oportunidade, uma borrasca mais forte veio a ocorrer, e o navio onde prestava serviço foi a pique. Salvei-me por milagre, pois minhas correntes, já gastas, se partiram quando grossa acha de madeira tombou sobre elas, enquanto o navio soçobrava.
Nadei com dificuldade até encontrar uma espécie de tonel, onde me segurei. Muitos homens, fortes e sadios, vi morrerem pelas águas. Outros, muito feridos, não puderam suportar.
Somente eu e um humilde empregado livre da embarcação sobrevivemos, pois conseguimos chegar a uma ilha, perto da qual naufragáramos.
Durante anos vivi com as argolas de ferro em meus membros. Delas não pude eu me livrar. Parecia que ficavam lá para lembrarem-me da minha miserável condição. Não poderia, sequer, ser resgatado por alguma embarcação, pois que seria recolhido como escravo novamente. Assim, tive que escolher viver no isolamento. Era livre agora, mas estava só, porque meu companheiro de infortúnio rapidamente partiu em busca da civilização. Neste estado, vivi às custas de escassos recursos de alimentação e moradia. Porém, pude meditar sobre a vida, tendo como companhia os animais e o vento incessante que vinha do mar. Estes não falavam comigo e até sentia que me rejeitavam de certa forma. Então, aprendi a perscrutar minha alma e a entender meus sentimentos. Adquiri compaixão pelos seres viventes. Como era só, aprendi a valorizar toda forma de vida. A natureza bravia ensinou-me a ser humilde.
Após muito tempo nesta situação, volvi meus olhos para o céu pela última vez, deixando o corpo de carne.
Liberto, atingi estância de rara beleza, mas seus portões estavam fechados. O porteiro, poderoso romano em sua resplendente armadura, barrou-me a passagem, indagando: “– Alto lá! O que queres aqui?” Respondi: “– Sou apenas um escravo e quero voltar a trabalhar.” Em meu íntimo desejava voltar a ter contato com as pessoas, mesmo que isto custasse a minha liberdade novamente. Então, o imponente homem analisou-me por uns instantes, mandando-me esperar. Após algum tempo, belo homem de alvas roupagens veio atender-me. Seus cabelos brancos indicavam que deveria ter larga experiência de vida. Ele disse-me que poderia entrar e que as argolas que demarcavam a minha condição de escravo seriam retiradas, já que naquele lugar só eram aceitos homens livres para o trabalho. Estremeci de alegria, pois não esperava tão grande sorte, aceitando prontamente a oferta.
Uma vez sendo incorporado à bela cidade espiritual, recebi a humilde incumbência da enfermagem. Tratava das feridas, das chagas daqueles que desencarnavam, principalmente em campos de batalha, mas que tinham mérito de serem acolhidos pelos espíritos de luz. Depois de longos anos de trabalho árduo, desenvolvi uma compaixão e solidariedade mais profundos com relação àqueles que sofrem. Pude perceber, que a solidão pela qual passei na ilha enquanto encarnado, mais a possibilidade de auxiliar meus antigos algozes romanos em plena espiritualidade, confraternizando-me com eles, era um sublime aprendizado de Amor ao próximo que eu recebia. Ou seja, a aspereza daquela minha vida material foi o remédio amargo que contribuiu decisivamente para a cura de meu espírito. Eu soube sorvê-lo sem revolta, alcançando minha liberdade com relação ao desejo de conquistas, e transformando a frieza do meu coração em receptividade para com o sofrimento alheio.
Mais à frente, reencarnei muitas vezes, podendo testar-me mais quanto às qualidades espirituais. Falhei em algumas oportunidades, melhorei-me em outras, mas não posso esquecer-me da já remota experiência que tive naquela ilha. Aquela encarnação está bastante viva em minha alma, pois foi o momento do meu despertar como ser humano e como filho de Deus”.
Simão  09/05/1995  (Espíritos diversos, Depoimentos do além, p. 46-47)

As sucessivas reencarnações são para nós espíritos endividados ou recalcitrantes a única maneira de nos purificarmos
e nos tornarmos merecedores de companhias espirituais cada vez mais elevadas.É também de maneira geral, o único modo de conquistarmos condições melhores de novas reencarnações.

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